Na Física Δ ii, Aristóteles isola o fenómeno da κίνησις relativamente aos operadores ἐνέργεια, ἐντελέχεια vs. Δύναμις. O ponto fundamental em discussão é a determinação da κίνησις como ἐνέργεια. Contudo, uma ἐνέργεια ἀτελής. Neste sentido, parece haver δύναμις envolvida no processo do movimento, da mudança e da alteração. É este o sentido do carácter indefinido ou indeterminado, ἀόριστον (201a24) da κίνησις. Assim, o capítulo ii do livro Δ tem a tarefa árdua de isolar e ver no seu funcionamento a tensão entre ἐντελέχεια e δύναμις que “comprimem” o fenómeno da mudança.
Aristóteles começa por tomar posição relativamente a quem no passado procurou explicar o fenómeno, designadamente, os Pitagóricos e Platão (pace Simplício.). Segundo, Aristóteles, estes disseram que a κίνησις era ἑτερότης, ἀνισότης, μὴ ὄν, respectivamente: alteridade, desigualdade, não ser, 201a20-21. Contudo, não há necessariamente mudança apenas porque as coisas são outras, desiguais ou inexistentes, ἕτερα ᾖ οὔτ’ ἂν ἄνισα οὔτ’ ἂν οὐκ ὄντα, 201a22. A transformação não se dá entre diferentes, nem entre desiguais, nem entre inexistências: nem para outro, nem a partir de outro, nem para o desigual nem a partir do desigual, nem para o inexistente nem a partir do inexistente. A transformação, μεταβολή, ocorre antes a partir dos opostos: ἐκ τῶν ἀντικειμένων, a24.
Ou seja, é um facto que quando uma substância sofre uma mudança, ela passa a ser outra relativamente à que era, mas não se pode dizer que se tornou noutra coisa, em absoluto. Do mesmo modo, podemos dizer que um ente não é igual ao que era, mas não que é absolutamente desigual de si. Menos compreensível é que o que não existia passa pela mudança a não existir. Podemos dizer relativamente que algo se tornou noutro, algo não está igual a si, ou que já não é o que era ou por ter adquirido características que não possuía ou por ter perdido as que tinha.
Quer dizer, em certo sentido faz parte da experiência fáctica que atesta a mudança que as coisas sofrem a verificação de que se tornaram noutras relativamente ao que eram, estão diferentes e não são o que eram. Mas essa atestação não explica a operação fundamental por que passaram. Por um lado, trata-se de um contraste feito por comparação entre dois momentos do ser a coisa que é. A mancha de água no chão da cozinha é a apresentação liquefeita dos cubos de gelo da véspera. A mancha de água permite antecipar o seu desaparecimento. Vai secar ou ser enxugada.
Entre água congelada, água derretida e água evaporada há alterações, desigualdades: não são os mesmos estados. Ainda assim, há um substrato idêntico que sofre as metamorfoses químicas que têm como resultado as diferentes formas de apresentação, desiguais entre si, alterações de estado que se convertem no que não eram.
A forma da apresentação num momento presente olha retrospectivamente, de forma mais ou menos imediata para a forma da apresentação anterior. No caso, ver uma mancha de água no chão da cozinha transporta-me imediatamente para o sentido da apresentação passada dos cubos de gelo que caíram na véspera. Mas também se abre um prospecto que antecipa o desaparecimento da mancha de água, à noite, pela sua evaporação. Ao mesmo tempo, dá-se pela abertura da perspectiva presente um olhar retrospectivo e um olhar em prospecto.
Por outro lado, o gelo, a água e o vapor estão numa conexão real que corresponde à alteração por que a água passa quando submetida a alterações de temperatura, à condensação e à rarefacção, ao congelar e ao derreter: transformação do gelo em líquido e do líquido em vapor.
Apesar dessa compreensão, o que nós temos são momentos fotográficos diferentes, anquilosados no tempo. Permitem sem dúvida perceber alterações, diferenças, que as apresentações não são as mesmas. Não “vemos” logo, contudo, o congelar nem o derreter. Não, nem que estivéssemos continuamente a olhar através de um vidro para o congelador ou a olhar para o gelo no chão a derreter lentamente. Vemos apenas de cada vez o efeito surtido por essas acções. O facto de os processos terem lugar e serem verificados é expressão do actuar das acções. Não, porém, o agir como tal das acções em causa.
O que está a operar-se Aristóteles tenta explicar pela relação complexa entre “a capacidade” da água se transformar: ser gelo, ser líquido, ser vapor. Essa transformação pode ser entendida pelas alterações de temperatura por que a água passa. O aumento ou diminuição da temperatura são, todavia, concretizações do modo como se pensa a passagem dessa capacidade da água à actividade concreta do seu ser transformada.
A mudança é este processo que transforma o potencial da água de cada vez no estado concreto em que passa a encontrar-se. A passagem do possível para o concreto, a possibilidade do concreto ser passível também de mudança deixam a κίνησις indeterminada. Não é apenas potência nem é apenas actualidade pura: τοῦ δὲ δοκεῖν ἀόριστον εἶναι τὴν κίνησιν αἴτιον ὅτι οὔτε εἰς δύναμιν τῶν ὄντων οὔτε εἰς ἐνέργειαν ἔστιν θεῖναι αὐτήν· 27-29.
“Nem o que pode ter um determinado tamanho ou tem actualmente um determinado tamanho é mudado necessariamente [para ficar com outro tamanho]. É assim que a ‘mudança’ parece ser um certa actualidade mas incompleta [isto é, não concretizada efectivamente, não actualizada] οὔτε γὰρ τὸ δυνατὸν ποσὸν εἶναι κινεῖται ἐξ ἀνάγκης οὔτε τὸ ἐνεργείᾳ ποσόν, ἥ τε κίνησις ἐνέργεια μὲν εἶναί τις δοκεῖ, ἀτελὴς δέ, 28-29)”. A causa disse ser assim é esta: o possível actualizável mas não efectivamente actualizado, não sendo aquilo em que se pode tornar é incompleto: ἀτελὲς τὸ δυνατόν, οὗ ἐστιν ἐνέργεια (33). É por isso que é tão difícil compreender o que é a mudança (χαλεπὸν αὐτὴν λαβεῖν τί ἐστιν (ibid). Por esse motivo não é possível determiná-la como privação absoluta, possibilidade absoluta ou actualidade absoluta (ἢ γὰρ εἰς στέρησιν ἀναγκαῖον θεῖναι ἢ εἰς δύναμιν ἢ εἰς ἐνέργειαν ἁπλῆν, τούτων δ’ οὐδὲν φαίνεται ἐνδεχόμενον, 34). Resta assim que se trata de uma certa actividade, uma actividade tal como a enunciamos: é sem dúvida difícil de perceber, mas é admissível (λείπεται τοίνυν ὁ εἰρημένος τρόπος, ἐνέργειαν μέν τινα εἶναι, τοιαύτην δ’ ἐνέργειαν οἵαν εἴπαμεν, χαλεπὴν μὲν ἰδεῖν, ἐνδεχομένην δ’ εἶναι.) 201b35-202a3.”
EXCURSO, MF, 1048B18-36:
“Ἐπεὶ δὲ τῶν πράξεων ὧν ἔστι πέρας οὐδεμία τέλος/ ἀλλὰ τῶν περὶ τὸ τέλος, οἷον τὸ ἰσχναίνειν ἢ ἰσχνασία/ [αὐτό], αὐτὰ δὲ ὅταν ἰσχναίνῃ οὕτως ἐστὶν ἐν κινήσει, μὴ/ ὑπάρχοντα ὧν ἕνεκα ἡ κίνησις, οὐκ ἔστι ταῦτα πρᾶξις ἢ/ οὐ τελεία γε (οὐ γὰρ τέλος)· ἀλλ’ ἐκείνη <ᾗ> ἐνυπάρχει τὸ/ τέλος καὶ [ἡ] πρᾶξις. οἷον ὁρᾷ ἅμα <καὶ ἑώρακε,> καὶ φρονεῖ <καὶ/ πεφρόνηκε,> καὶ νοεῖ καὶ νενόηκεν, ἀλλ’ οὐ μανθάνει καὶ μεμά-/ θηκεν οὐδ’ ὑγιάζεται καὶ ὑγίασται· εὖ ζῇ καὶ εὖ ἔζηκεν ἅμα,/ καὶ εὐδαιμονεῖ καὶ εὐδαιμόνηκεν. εἰ δὲ μή, ἔδει ἄν ποτε παύε-/ σθαι ὥσπερ ὅταν ἰσχναίνῃ, νῦν δ’ οὔ, ἀλλὰ ζῇ καὶ ἔζηκεν./ τούτων δὴ <δεῖ> τὰς μὲν κινήσεις λέγειν, τὰς δ’ ἐνεργείας./ πᾶσα γὰρ κίνησις ἀτελής, ἰσχνασία μάθησις βάδισις οἰκοδό-/ μησις· αὗται δὴ κινήσεις, καὶ ἀτελεῖς γε. οὐ γὰρ ἅμα/ βαδίζει καὶ βεβάδικεν, οὐδ’ οἰκοδομεῖ καὶ ᾠκοδόμηκεν, οὐδὲ/ γίγνεται καὶ γέγονεν ἢ κινεῖται καὶ κεκίνηται, ἀλλ’ ἕτε-/ ρον, καὶ κινεῖ καὶ κεκίνηκεν· ἑώρακε δὲ καὶ ὁρᾷ ἅμα τὸ/ αὐτό, καὶ νοεῖ καὶ νενόηκεν. τὴν μὲν οὖν τοιαύτην ἐνέργειαν/ λέγω, ἐκείνην δὲ κίνησιν. τὸ μὲν οὖν ἐνεργείᾳ τί τέ ἐστι/ καὶ ποῖον, ἐκ τούτων καὶ τῶν τοιούτων δῆλον ἡμῖν ἔστω.] (Uma vez que nenhuma das acções, πράξεις, que têm limite são completas, τέλος, mas processam-se numa aproximação ao que completa, como, por exemplo, o emagrecer, τὸ ἰσχναίνειν, e a acção do emagrecimento em si, ἰσχνασία. Quando as partes do corpo, αὐτά, estão a emagrecer passam ainda por uma mudança mas de tal sorte que ainda não se encontram no fim do processo de emagrecimento que o iniciou. Não se trata aqui de uma acção, ou pelo menos não de uma completa (porquanto não se chegou ao fim que a completa). Acção completa é aquela por onde o fim existe intrinsecamente ao mesmo tempo do que o seu desdobramento: <ᾗ> ἐνυπάρχει τὸ/ τέλος. Como, por exemplo, quando alguém está a ver, ὁρᾷ, e tem e terá também simultaneamente visto, ἑώρακε, ou quando está a pensar tem e terá simultaneamente pensado, ou como quando tem uma intuição, tem e terá ao mesmo tempo intuído. Mas quando começa a aprender ainda não aprendeu nem quando começa a tratar-se já terá obtido a saúde. Quem vive de uma boa maneira tem e terá simultaneamente vivido bem e quem é feliz tem e terá simultaneamente sido feliz. Se não for o caso, seria necessário que os processos cessassem como acontece no caso de alguém que está a fazer dieta de emagrecimento, ora não é isso que acontece. Mas alguém começa a viver e fica logo completamente envolvida no ter vivido. É assim que é preciso referir as mudanças e as actividades. Toda a mudança é incompleta: emagrecimento, aprendizagem, caminhada, construção. Estas acções são sem dúvida mudanças, contudo são incompletas. Não acontece que encete uma marcha e já tenha percorrido o caminho nesse preciso instante, nem que comece a construir uma casa e nesse preciso instante do início a tenha terminado de construir, nem se dá também o caso de estar em vias de ser e ter já começado completamente a ser ou começar a mudar e ter mudado completamente. Há uma diferença: uma coisa é começar a mudar outra é ter mudado já completamente. É ao mesmo tempo que acontece o processo de começar a ver e ter visto e continuar a ver, bem como intuir uma vez e ter por intuído. Refiro-me a este processo como actividade, aquele outro é o da mudança. Fique assim evidenciado o que entendemos pelo que existe em actividade e de que modo assim existe, a partir destes exemplos e de outros deste género.)”
O passo estabelece a diferença entre κίνησις e ἐνέργεια. Na verdade trata-se de uma análise de modos diferentes de ser, estar ou existir em actividade: ἐνέργειαι. Um, é completo: τέλειος, o outro, incompleto, ἀτελής. Os exemplos são claros e apontam para os diferentes modos de se constituírem.
À primeira vista, pode perceber-se que a actividade incompleta da mudança requer tempo para se tornar completa e assim chegar ao fim do processo. A actividade completa acontece por assim dizer logo a partir do primeiro instante em que se acciona. Intrinsecamente, Aristóteles diz que a mudança ou alteração são processos que têm de “queimar etapas”, processam meios, para chegar ao fim. Por outro lado, a actividade pura está já completa por assim dizer. É no princípio, no meio e no fim da sua activação exactamente da mesma maneira. Não melhora, porque é perfeita se assim se pode dizer. É já no princípio como no fim.
Sucede por estas razões que, quando uma alteração ou mudança chegam ao seu fim por estarem completas, o seu resultado ou produto acabado implica contrariamente que elas cessaram a sua actividade. Já não há mudança. Apenas, o resultado dela. Já não há alteração. Somente, algo alterado.
Quando se atinge o peso requerido, cessa o processo de emagrecimento. Quando a casa está pronta, cessa a actividade de construção. Quando se aprendeu, cessa o processo de aprendizagem.
Diferentemente, numa actividade completa, não apenas ela está completamente realizada no princípio como no fim, como o seu resultado coexiste simultaneamente à sua acção. Meio e fim, acção e resultado: estão integrados na própria actividade. Assim, quando estamos a ver qualquer coisa não estamos no processo de formar a visão e a coisa vista. É tudo logo ao mesmo tempo.
Podemos dizer que não estávamos a ver bem e que passámos a ver melhor. Mas há sempre um grau positivo. O visto está já a ser visto e o ver está já a ver o visto. A partir daí pode-se dar-lhe maior atenção, atender ao pormenor, aumentar a visibilidade, melhorá-la etc., etc.. O mesmo se passa quando penso num determinado conteúdo, quando finalmente percebo qualquer coisa ou a entendo. É o que acontece em experiências em que dizemos: “Ah! Estou a ver!”. Ou ainda, é o caso da compreensão imediata de um conteúdo: uma intuição. A intuição enquanto intuição não é preparada é tida ou tem-nos. O pensamento enquanto pensamento não é preparado: é tido ou oferece-se-nos. O ver o visto não é preparado enquanto tal. É dado tudo ao mesmo tempo.
Podemos dizer que não estávamos a ver bem e que passámos a ver melhor. Mas há sempre um grau positivo. O visto está já a ser visto e o ver está já a ver o visto. A partir daí pode-se dar-lhe maior atenção, atender ao pormenor, aumentar a visibilidade, melhorá-la etc., etc.. O mesmo se passa quando penso num determinado conteúdo, quando finalmente percebo qualquer coisa ou a entendo. É o que acontece em experiências em que dizemos: “Ah! Estou a ver!”. Ou ainda, é o caso da compreensão imediata de um conteúdo: uma intuição. A intuição enquanto intuição não é preparada é tida ou tem-nos. O pensamento enquanto pensamento não é preparado: é tido ou oferece-se-nos. O ver o visto não é preparado enquanto tal. É dado tudo ao mesmo tempo.
Não se passa assim com os processos em que os encontramos envolvidos numa organização dos meios já disponibilizados, numa hierarquia e ordenação das fases de processamento e elaboração que conduzem ao produto acabado. Para atravessar uma estrada, eu preciso do primeiro até ao último passo que me leva a percorrê-la. No momento em que estou no outro lado da rua, cesso o meu atravessá-la. Quando se percorre o caminho de Atenas a Tebas, chegados a Tebas deixamos de percorrê-lo. Quando começo os tratamentos de uma doença não estou ainda curado. Quando estou completamente restabelecido cesso o tratamento. O resultado obtido implica que a acção que lhe esteve na base cessou.
As acções incompletas aproximam-se do fim, anulando o carácter de incompletude, queimando as etapas e as fases que levam organizada e ordenadamente ao seu objectivo final: τῶν πράξεων περὶ τὸ τέλος. A ἐνέργεια é ἀτελής ou οὐ τελεία. Ao emagrecer, ainda não se está magro. Pelo simples facto de se ter iniciado uma dieta não se fica logo com o peso desejado.
A oração subordinada adverbial temporal é introduzido por ὅταν+conjuntivo, ἰσχναίνῃ. Há uma consecutiva introduzida por οὕτως, de tal modo que… enquanto está em vias de mudança, ἐν κινήσει, aquilo por mor do qual, em vista do qual, ὧν ἕνεκα, a mudança teve o seu início e foi posta em prática ainda não está disponível: μὴ ὑπάρχοντα.
A oração subordinada adverbial temporal é introduzido por ὅταν+conjuntivo, ἰσχναίνῃ. Há uma consecutiva introduzida por οὕτως, de tal modo que… enquanto está em vias de mudança, ἐν κινήσει, aquilo por mor do qual, em vista do qual, ὧν ἕνεκα, a mudança teve o seu início e foi posta em prática ainda não está disponível: μὴ ὑπάρχοντα.
A sintaxe dos aspectos verbais permite compreender os enunciados aparentemente crípticos ou redundantes de Aristóteles para descrever as actividades completas. À letra, lê-se: “vê ao mesmo tempo que viu, e pensa ao mesmo tempo que pensou e intui ao mesmo tempo que intuiu”. ‘Καί’ introduz os segundos termos da comparação: viu, pensou, intuiu. Os verbos conjugados ἑώρακε, πεφρόνηκε, νενόηκεν estão na terceira pessoa do pretérito perfeito da voz activa de ὁράω , φρονέω e νοέω, respectivamente. As traduções correspondentes em português não restituem ou reconstituem na conjugação simples do pretérito perfeito o que o grego diz.
O pretérito perfeito traduz quase o aoristo. Indica o aspecto de uma acção que teve e início e fim no passado. está terminada, portanto. Mas permite acentuar o carácter instantâneo da acção. Em “vi”, por exemplo, pode estar indicado: “já vi uma vez e não vejo mais”, “vi uma vez”. Foi no passado e a acção está terminada. Ora o que o grego diz acentua o aspecto resultativo do perfeito. Ou seja, o perfeito não acentua o aspecto da acção terminada e tornada ineficaz. Pode acentuar o aspecto de uma acção que teve já o seu início e o seu início teve lugar no passado. Mas o seu efeito projecta-se ainda no presente e na verdade continua no presente agora como então e lança-se para o futuro.
Quer dizer, vi e continuo a ver, mesmo que o início da minha acção de ver se tenha dado no passado. O perfeito acentua a acção completa que está já constituída, mas não o facto de ter terminado, porquanto o seu efeito continua agora e terá continuado como no princípio. Neste sentido, o perfeito não tem nada que ver com o pretérito. Há perfeitos do futuro. O aspecto verbal tem que ver com o carácter da acção estar completamente acabada, mas não terminada: está a ser como foi e terá sido.
O pretérito perfeito traduz quase o aoristo. Indica o aspecto de uma acção que teve e início e fim no passado. está terminada, portanto. Mas permite acentuar o carácter instantâneo da acção. Em “vi”, por exemplo, pode estar indicado: “já vi uma vez e não vejo mais”, “vi uma vez”. Foi no passado e a acção está terminada. Ora o que o grego diz acentua o aspecto resultativo do perfeito. Ou seja, o perfeito não acentua o aspecto da acção terminada e tornada ineficaz. Pode acentuar o aspecto de uma acção que teve já o seu início e o seu início teve lugar no passado. Mas o seu efeito projecta-se ainda no presente e na verdade continua no presente agora como então e lança-se para o futuro.
Quer dizer, vi e continuo a ver, mesmo que o início da minha acção de ver se tenha dado no passado. O perfeito acentua a acção completa que está já constituída, mas não o facto de ter terminado, porquanto o seu efeito continua agora e terá continuado como no princípio. Neste sentido, o perfeito não tem nada que ver com o pretérito. Há perfeitos do futuro. O aspecto verbal tem que ver com o carácter da acção estar completamente acabada, mas não terminada: está a ser como foi e terá sido.
O mesmo se pode dizer acerca do aspecto do modo indicativo no tempo presente. “Vê”, “pensa”, “intui” não diz apenas o instante: Vê o que não via para deixar de ter visto logo nesse instante. Pensa o que não pensava para logo se esquecer do que pensou. Intui o que era incompreensível para logo se dissipar no momento seguinte. O presente tem o aspecto de uma duração qualitativa. Mesmo que instantânea a acção ela tem efeitos perfectivos e duradouros: vejo e estou a ver: estou vendo, penso e estou a pensar, estou pensado. Intuo e estou a intuir, estou intuindo, etc.. A combinação da expressão compacta do presente do indicativo com o pretérito perfeito acentua o aspecto completo de uma acção que continua a surtir efeito, um efeito que está logo constituído no primeiro instante em que essa acção entra em actividade.
Notas:
1 Cf.: ‘περί’ WITH ACCUSATIVE in LSJ: I. 1. of Place, prop. of the object round about which motion takes place, (…) ἄστυ πέρι . . διώκειν ib.173,230; ἐρύσας π. σῆμα 24.16, cf. 51, etc.; π. φρένας ἤλυθ’ ἰωή10.139: π. φρένας ἤλυθε οἶνος Od.9.362: also of extension round, ἑστάμεναι π. τοῖχον, π. βωμόν,Il.18.374, Od.13.187, etc.; λέξασθαι π. ἄστυ Il.8.519: μάρνασθαι π. ἄ. 6.256, etc.; I.3. of the object about which one is occupied or concerned, π. δόρπα πονεῖσθαι, π. δεῖπνον πένεσθαι, Il.24.444, Od.4.624 (but π. τεύχε’ ἕπουσι, tmesis for περιέπουσι, Il.15.555); I. 4. round or about a place, and so in, π. νῆσον ἀλώμενοι Od.4.368, cf. 90; ἐμέμηκον π. σηκούς 9.439: ἃν π. ψυχὰν γάθησεν in his heart, Pi.P.4.122; χρονίζειν π. Αἴγυπτον Hdt.3.61, cf.7.131; εὕροι ἄν τις [βασιλείας] π. τοὺς βαρβάρους Pl.R.544d, etc.; οἱ π. Φωκίδα τόποιPlb.5.24.12, etc.
2 ἰσχν-αίνω, fut. -ᾰνῶ (συν-) E.IA694 codd.: aor. ἴσχνᾱνα A.Eu. 267, Ar.Ra.941; Ion. -ηναHdt.3.24, Hp.Off.13:—Med. (v. κατισχναίνω) :—Pass., aor. ἰσχνάνθην Id.Coac.369, 407: (ἰσχνός):—make dry, wither, ἐπεὰν τὸν νεκρὸν ἰσχνήνωσι, of a mummy, Hdt.3.24, cf. Hp.Aph.5.22,A.Eu.267, Pl.Grg.522a, etc.; ἰ. τὸ σῶμα Hp.Art. 33, cf. Pl.Plt.293b, Arist.Metaph.1048b27; ἔπινε βρῦτον ἰσχναίνων χρόα A.Fr.124.
3 ὁράω (ὁρα- for ϝορα-) see: imperf. ἑώρων, fut. ὄψομαι (ὄψει 2 s.), 2 aor. εἶδον (ἰδ- for ϝιδ-), 1 perf. ἑόρα_κα and ἑώρα_κα (plup. ἑωρα_κη), ἑώρα_μαι and ὦμμαι, ὤφθην, ὀφθήσομαι, ὁρα_τός, περι-οπτέος. Cf.: Herbert Weir Smyth [n.d.], A Greek Grammar for College, ad loc.
4 φρον-έω, Ep. subj. φρονέῃσι Od.7.75: Ep. impf. φρόνεον Il.17.286, φρονέεσκον A.R.4.1164: fut.-ήσω Ar.Ec.630 (anap.), etc.: aor. ἐφρόνησα Hdt.1.60, A.Eu.115, etc.: pf. πεφρόνηκα Emp.103.1,Isoc.5.124, D.S.18.66:—Pass., Arist.Xen.980a9; imper. φρονείσθω v.l. for φρονεῖτε in Ep.Phil.2.5:—to be minded, either of reflection or of purpose. Cf. LSJ, ad loc.
5 νο-έω, Aeol. νόημι (q.v.): Ep. aor. 1 νόησα Il.8.91; Ion. ἔνωσα (ἐν-) Hdt. 1.86: pf. νενόηκα, Ion.νένωκα (ἐν-) Id.3.6; imper. νενόηθι Hilgard Excerpta e libris Herodiani 30:—Med., Ep. aor.νοήσατο Il.10.501; part. νοησάμενος Alc.Supp.7.6, νωσάμενος Thgn.1298, Theoc.25.263,Call.Fr.345, etc.:—Pass. (mostly in med. sense), fut. νοηθήσομαι S.E.P.2.175, Gal.UP17.1: aor.ἐνοήθην Pl.Lg.692c; also Ion. (ἐπ-) Hdt.3.122, 6.115: pf. νενόημαι, Ion. νένωμαι Anacr.10,Hdt.9.53, S.Fr.182, Aëthlius 4: 3sg. plpf. ἐνένωτο (in med. sense) Hdt.1.77. Hdn.Gr.2.253 citesνοῦνται from Democr. (v. infr.) and pf. Pass. νένοται. LSJ, ad loc.
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