Iª
parte: O elenco das diversas acepções em que se pode considerar uma entidade, οὐσία.[1]
MF, Zeta, 1028b8 e sg.: “Parece que a substância
pertence de forma mais manifesta aos corpos, Δοκεῖ δ’ ἡ οὐσία ὑπάρχειν
φανερώτατα μὲν τοῖς σώμασιν”.
A primeira ordem
de exemplos apresenta seres vivos, animais, vegetais como todos concretos que
configuram partes heterogéneas entre si.
A) τά ζῷα, os seres vivos ganham corpo onde
encarnam, conforme sejam aves, peixes ou animais terrestres. Cada espécie tem o
seu corpo diferente, adaptado ao meio ambiente em que habita, com uma
determinada etologia. As partes dos seres animais articulam-se em órgãos e
aparelhos. A interdependência dos órgãos com diversas funções e as funções dos
aparelhos revelam uma mesma estrutura dentro do organismo. Cada ser animal é
pensado como um indivíduo, dentro de uma espécie. Os gatos e os cães são
espécies de animais. Mas cães, gatos e couves são espécies de seres vivos.
B) τὰ φυτὰ, o mesmo se passa com
os produtos da natureza, couves, alfaces, tomates e batatas, árvores, flores,
relva, etc., etc.. τὰ μόρια αὐτῶν. Numa segunda consideração pensa-se um todo
individual que existe com um corpo próprio natural dotado de interior e
exterior de partes ligadas entre si interdependentes e todas relacionadas com o
todo que são. A forma como se pensa a articulação entre partes e todo pode ser
simplesmente artificial.[2]
Consideremos a descrição morfológica de uma couve:[3]
O caule é erecto, podendo ser
curto, como no repolho, ou longo, como na couve-galega.
As folhas
da base podem diferir das folhas terminais: as basilares
podem ser lirado-penatipartidas, enquanto que as folhas
superiores podem ser oblongas,
obovadas, onduladas, denteadas, formando, ou não, uma "cabeça" de
folhas apertadas, antes da floração. Ao longo do caule (também
chamado de talo) podem formar-se pequenos ramos ou gemas,
como na couve-galega, ou na couve-de-bruxelas. As flores, dispostas em rácimos terminais
erectos, podem ser brancas ou amarelas, com sépalas
erectas e corola composta
por quatro pétalas obovadas,
unguiculadas (com forma de unha). Tem estames tetradinâmicos,
(quatro com filetes compridos e dois curtos). Os frutos são síliquas cilíndricas
ou subcompridas rostradas (com um prolongamento em forma de bico na
extremidade).
A descrição apresenta uma multiplicidade de elementos que estão numa
relação entre si, à partida espacial. Partes de baixo e partes de cima, caule e
folhas. Mas a compreensão do carácter da ligação de uma parte às restantes e de
todas ao todo concreto que é uma couve implica um outro nível de
aprofundamento. A entidade que é a couve compreende-se não apenas no “caldo
verde” ou na embalagem contendo as folhas da couve já cortadas para o caldo
verde. Vê-se na horta a crescer, vê-se em exposição na banca do mercado.
Quando, por exemplo, dizemos que as couves já não estão frescas, identificamos
sintomas de apodrecimento: as folhas tornaram-se amarelas, apodrecem, não podem
ser consumidas. A relação da couve com a sua οὐσία implica-a também
no princípio do fim. Ou seja, a privação da relação desta couve com o que dela
faz ser uma couve, é o seu apodrecimento ou não ainda maturação. A couve é maximamente
couve quando atingiu o seu grau máximo de desenvolvimento. Se não for colhida,
morre. Há uma tensão entre a couve e a dignidade que atinge no seu apogeu e o
princípio do apodrecimento ou envelhecimento.
C) Elementos e estruturas elementares:
Aristóteles considera outros tipos de corpos físicos ou naturais ou corpos
que pertencem à natureza, mais correctamente, são elementares: fogo, água e
terra. Note-se apenas que o ar e o éter não são considerados, mas não há razão
para não serem aqui referidos. τὰ φυσικὰ σώματα, οἷον πῦρ καὶ ὕδωρ καὶ γῆν
καὶ τῶν τοιούτων ἕκαστον. Cada um deles é pensado como um elemento. O fogo não
é um mega fogo. É a oxidação de um combustível libertando calor. É isso que de
cada vez acontece quando acendemos fogões e lareiras, fazemos lume ou nos
confrontamos com um incêndio. Também a água e a terra são estruturas
elementares descritas de forma mais ou menos complexa como contendo átomos e
moléculas, sais minerais, elementos das mais diversas naturezas: ouro, ferro,
solo, etc., etc..
Aqui também a relação entre partes e todo é pensada de acordo com a forma
complexa como as partes são integradas ou ficam envolvidas pelos todos
concretos. Uma parte de fogo é fogo? Tal como a água num copo reúne as
condições da água dos Oceanos para ser água. A diferença é quantitativa? Qual é
a quantidade mínima de água para que a água possa ser água?
D) Unidades de sentido. Exemplo: o céu.
Por outro lado,
considera-se uma articulação de partes e todo que depende de uma organização de
uma entidade que assim se cria ou existe. Por exemplo o céu e o mar, e a terra.
A linha do horizonte divide na praia o céu e a terra. Mas o céu contem os
Astros, a lua e o sol e as outras estrelas. A Terra, Oceanos e florestas, o
interior e a sua superfície. Os Oceanos, diversos entes, rochas, flora e fauna,
etc.. Terra, água e céu fazem parte do universo, etc., etc.. ὅσα ἢ μόρια τούτων
ἢ ἐκ τούτων ἐστίν, ἢ μορίων ἢ πάντων, οἷον ὅ τε οὐρανὸς καὶ τὰ μόρια αὐτοῦ, ἄστρα
καὶ σελήνη καὶ ἥλιος)·
[1] Cf.: “Bei dem ti ên einai schliessen wir uns der
Ansicht an, dass es sich um eine Kurzformel für Ausdruecke wie etwa: ti ên tôi
anthrôpôi anthrôpôi einai etwa handelt. Das ên verstehen wir im Sinne des sog.
"philosophischen Imperfekts", das freilich im Deutschen keine
(wissenschaftssprachliche) Entsprechung hat, und uebersetzen also: "Was es
heißt, dies zu sein". Das
"Was es heißt, dies zu sein" muss so verstanden werden, daß es das
bedeutet, was z. B. den Menschen
zum Menschen, ein Haus zum Haus macht (vgl. unseren Kommentar zu Z 2, I028b34). 'ti estin bzw. 'to ti estin”
uebersetzen wir: "Was etwas ist'" bzw., wenn der jeweilige Gegenstand
schon bestimmt ist: "Was es ist". "Ein Dies von der Art", “tode”
als Demonstrativum, das TI aber als Spezifizierung ansehen. LOGOS uebersetzen
wir ueberall dort, wo es den logos einer Sache bezeichnet, mit
"Formel", in Anlehnung an Ross' "formula".” Frede, M., &
Günther, P. (1988). Aristoteles metaphysik Z , bd. 1. Kommentar, München, p. 19 e sg.
[2] Veja-se o
seguinte elenco: Órgãos do Corpo Humano: Baço, Bexiga Urinária, Célula, Cérebro, Coração, Dentes, Esôfago, Esqueleto, Estômago, Faringe, Fígado, Glândulas, Salivares, Intestino Delgado, Intestino Grosso, Laringe, Pâncreas, Pulmão, Rins, Sangue, Traquéia, Vesícula Biliar. Aparelhos
/ Sistemas do Corpo Humano: Sistema Circulatório, Sistema Digestório (Digestão),
Sistema Endócrino (Hormônios).
Sistema Excretor (Urinário),
Sistema Linfático, Sistema Muscular, Sistema Nervoso, Sistema Reprodutor, Sistema Respiratório, Sistema Sensorial (Sentidos).
[3] http://pt.wikipedia.org/wiki/Couve.
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